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Vamos passear.

Vou levar-te até mim com a tua idade.

Não tenho a tua mão para te amparar, não te tenho no meu colo para te mostrar um mundo maior.

Não tenho o teu ouvido para te segredar os meus mimos.

Falta-me a tua pele para me sentir em ti,

mas tenho-te.

 

Vamos passear.

Levo-te no embalo dos meus sonhos.

Desenho-te na imaginação com que me iludo.

Agasalho-te nas palavras em que me ouço falar-te.

Falta-me o carrinho e a bola para brincarmos,

mas tenho-te.

 

Vamos passear.

No Largo da Praia, brincamos em mim, ao peão e ao arco, ao trinta e um e ao “quantos passos?”

No parque, escorregamos com pressa para chegarmos ao baloiço e logo corremos para voltar ao escorrega.

Não tenho a tua roupa para sacudir ou uma mazela para te acudir,

mas tenho-te.

 

Vamos passear.

Subimos com pressa as escadas da Alfandega, o eléctrico está mesmo a chegar.

Tlim-tlim-tlim, o eléctrico vai partir.

Fixamos o rio para nos distrair.

Os barcos cheios de turistas e os teus olhos nos meus para lhes sorrir.

Ouço-te em mim, o que é aquilo? O helicóptero está a levantar.

Sinto-te no meu braço a acenar com estilo.

Sim, com estilo, tu és tão bonito quando acenas adeus.

Faço dos meus os olhos teus,

mas tenho-te.

 

Vamos passear.

Corres à toa no Passeio Alegre, pareces a tua mãe quando aqui vinha brincar.

O coreto e o jardim, o minigolfe e as gaivotas; levo os teus pés nas minhas botas.

Claro que havemos de voltar com a bicicleta, correr e saltar atrás da borboleta, e preferires o gelado à tua chupeta.

Um dia será, mas tenho-te.

 

Ouço-te em mim; ó avô, podemos voltar?

 

Fernando Morgado, avô.

(o dia 29 é quando um avô quiser)

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