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Olá Dudu.

És tão pequenino mas tão grande para tudo o que eu quero guardar em ti. Vais crescer, vais caminhar e, mais que caminhar, vais fazer os teus caminhos.

Tantas vezes vais pensar que caminhas sozinho mas, avisadamente, descobrirás que alguns passos teus alguém os deu por ti.

Um dia, vês um musgo numa rocha e apressas-te a fotografar; eu já andei nesse caminho.

 Entre o nascer e o por do sol, ou entre o nascer e o por da lua, ficarás encantado com as sombras que esses astro produzem ou com as claridades que ambos projectam; eu já tive esses olhares.

Não saberás o que é tremer em frente a uma folha A4, na hesitação das palavras que não saem. Já não se usará. Mas saberás teclar e googlar, facebookar e abreviar – pk qq qd tb nd, e mais não sei quê -, e sentirás um jorro de palavras que se agrupam em texto; eu já escrevi esses medos.

Hoje, na distância longa dos teus primeiros 123 dias de vida, é mais um dia em que cresces sedimentado no meu ADN. Não te livras de mim, e eu fico feliz!

Vê bem, 123 dias, 123, 1 2 3 – é assim que tanta coisa começa. Vais ouvir isto muitas vezes: vá lá, Dudu, força, vamos…um…dois…três…conseguiste!

Estou aqui, prazerosamente sentado, a deliciar-me com a beleza de um pisco-de-peito-azul que se acoitou no meio dos guarda-rios, na companhia de umas aves pernaltas que não identifico. Do lado de lá, com a Foz nos meus olhos, espalma-se o meu Porto entre o rio e o mar.

Havemos de vir a esta paz, a todas as pazes que já desenhei para as partilhar contigo.

Não sei se a cegonha branca que vive no Parque Biológico de Avintes já teve os seus filhotes. Sabes que a malandra, munida dos truques de toda a sua beleza, enfeitiçou um macho selvagem a meio da migração que o levava para o sul e cativou-o em copulação fecunda.

Os filhotes da cegonha não vieram de Paris, e ela, de tão ocupada que estava, também não foi a Paris buscar-te. Possivelmente, tu e os filhos da pernalta nasceram ao mesmo tempo. Devem ser bonitos, os passarocos, tal como os seus progenitores. Também tu és muito bonito!

És fantasticamente bonito! Tal como os teus progenitores e os progenitores dos teus progenitores e os progenitores dos progenitores dos teus progenitores.

És fantasticamente bonito! Não tens os caracóis que eu tenho, a minha cor de olhos, o meu prognatismo, as orelhas grandes que deixei crescer para te ouvir melhor, as minhas mãos…

És fantasticamente bonito. Se um dia te perguntarem em que é que tu és parecido comigo, saberás responder que o essencial não se vê com os olhos.

Olha! O pisco-de-peito-azul olhou para mim! Saltitou meia dúzia de passos, pavoneou-se no azul do seu peito – o azul, claro! – e disse-me um segredo:

“Nunca cales as palavras que o teu coração te dita. Diz ao teu neto que o amas muito!”

Ouviste, Dudu?

O teu avô ama-te muito!

Um…dois…três…um beijo para ti!

 

Fernando Morgado, avô.

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