MOSAICOS DA MINHA VIDA – 5
No Porto, quando alguém diz que nasceu ou mora na Rua dos
Armazéns, nº 55 casa 26, está a falar de uma “ilha”…e o Porto tem tantas destas
ilhas, ainda.
Ora, esta morada, acima referida, é exactamente o sítio onde
nasci e cresci – na Quinta do Loureiro. Em Miragaia, claro.
Pouca gente desta freguesia não saberá onde fica a ilha da
Quinta do Loureiro. O que nem tantos saberão é a origem deste nome – Loureiro.
Ao longo dos anos, e em pesquisas que faço para as minhas
escritas, tenho encontrado as mais diversas versões para este nome, mas a única
a que dou credibilidade é à que nasce no Jardineiro-Mor José Marques Loureiro,
o “jardineiro das Virtudes” como vulgarmente era conhecido.
Este homem, com fama já granjeada na Beira-Alta, veio para o
Porto a convite da Câmara da cidade, e deram-lhe a incumbência de criar novos
jardins na urbe, melhorar os existentes e fornecer a Câmara e a Corte com as
suas belas flores e plantas.
Para esse fim, concederam-lhe umas terras em socalcos na
encosta das Virtudes e que desciam até à praia, então existente.
A tarefa era árdua e exigente. A cidade estava em plena
época de industrialização, logo, em grande crescimento, mas faltava mão-de-obra
para levar em frente este projecto.
José Marques Loureiro cria as condições necessária para a
sua tarefa, constrói a Casa das Virtudes – hoje, Cooperativa Artística Árvore -,
e dá início ao que ainda hoje se chama Jardim das Virtudes. Convém lembrar que
em Miragaia todos o conhecem, simplesmente, pelo Horto.
José Marques Loureiro está imortalizado por uma estátua – a
Flora – no Jardim da Cordoaria.
Sabemos todos, os que cá nasceram e viveram, as lendas e
mitos que se contavam deste Horto: desde almas que apareciam pela calada da
noite, caveiras luminosas que assombravam os vivos, até outras maleitas que
desciam pelo Rio Frio que corre subtérreo pela Rua de S. Pedro de Miragaia até
ao Rio Douro. Creio, sem certezas, ser este o mesmo rio que serve de cenário no
Museu dos Descobrimento, a descoberta mais recente do Sr. Mário Ferreira, vulgo
DouroAzul.
Voltando a José Marques Loureiro e à Quinta que tem o seu
nome: como disse, este espaço não é mais que uma ilha, das muitas que há no
Porto. A sua origem deve-se à necessidade que o Sr. José Marques Loureiro teve
de contratar gente para a sua actividade e não haver na cidade a mão-de-obra
que ele precisava.
Vieram pessoas de fora, da ruralidade, para desempenharem
essas tarefas. Para isso, era necessário dar-lhes habitação e condições. Foi o
que fez o mestre jardineiro construindo vários prédios, ainda hoje existentes,
com uma só entrada: o nº 55 da Rua dos Armazéns – a Quinta do Loureiro.
Na Casa 26, nasci eu e os meus irmãos, e tanta gente que
Miragaia não esquece.
Voltarei à Quinta para vos deliciar com tantas estórias lá
vividas. Lembro-vos - quem não se lembra? – os Correia Dias (Libório, Toninho,
Zé…), a Maria Preta e o Deolindo, o Bolinhas e a Tira-a-bicha (a rosa, a Zeza,
o Fernando…), o Unhancas, os Palavrinhas, a Alcininha (talhava tudo o que era
doença ruim), o Adão (a filha Luísa que morreu tão nova com cancro da mama), o
Tchuta e o Beira-Alta, as Rabelas, a Tendeira (lembro o meu amigo Zé Manel
Preto), o Virgílio (tio dos Rubins), o Jacinto sapateiro, o Fernando francês, o
Vicente (Mau-mau, Paulo, Guida…), o Carlos Alberto, o Xico, o Maximiano e a
Noeminha (meus pais), o Marito, o Zé barbeiro, a Ana Bananeira, o Zé Eusébio
(tio do Libório): muitos mais tenho para citar; muitas mais estórias tenho para
contar.
Voltarei à Quinta do Loureiro: tenho lá o meu ADN.
Fernando Morgado
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